Stalking e Cyberstalking no Brasil: A Criminalização da Perseguição e o Desafio da Era Digital
- Nayra Figueiredo
- 27 de mai.
- 4 min de leitura
Atualizado: 16 de out.
O crime de stalking ganhou destaque no cenário jurídico brasileiro após a promulgação da Lei nº 14.132/2021, que incluiu o artigo 147-A no Código Penal, criminalizando a perseguição reiterada que causa medo, sofrimento emocional ou restrição de liberdade à vítima. Desde então, o stalking deixou de ser uma conduta meramente incômoda para se tornar uma infração penal, punida com reclusão de seis meses a dois anos e multa, podendo ser agravada em determinadas circunstâncias.
No contexto contemporâneo, porém, a prática mais comum é o cyberstalking, modalidade de stalking que se desenvolve por meios digitais — redes sociais, aplicativos de mensagens, e-mails, geolocalização e até vigilância eletrônica disfarçada. O cyberstalking é uma evolução tecnológica do stalking tradicional, que amplia o alcance e o impacto da perseguição, permitindo que o agressor invada a intimidade da vítima sem sair de casa.
1. Conceito e Tipificação do Stalking
O stalking, em sua forma clássica, caracteriza-se pela perseguição sistemática e obsessiva de uma pessoa, de modo a interferir em sua vida privada, liberdade e tranquilidade. Antes da Lei nº 14.132/2021, essas condutas eram enquadradas em tipos penais como ameaça (art. 147, CP), moléstia à tranquilidade (art. 65, LCP) ou perturbação da paz — o que gerava insegurança jurídica e impunidade.
Com a nova legislação, o crime de stalking foi tipificado de forma clara: “Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo sua liberdade de locomoção ou invadindo ou perturbando sua privacidade”.

O stalking pode ocorrer presencialmente (seguimentos, vigilância, presença constante em locais frequentados pela vítima) ou virtualmente, por meio do cyberstalking.
2. Cyberstalking: A Perseguição no Ambiente Digital
O cyberstalking é uma das expressões mais graves do stalking moderno. Ele ocorre quando o perseguidor utiliza recursos tecnológicos para vigiar, monitorar, ameaçar ou constranger sua vítima. As redes sociais são o palco principal do cyberstalking, onde o agressor pode criar perfis falsos, enviar mensagens intimidatórias, divulgar fotos, rastrear atividades e até expor informações pessoais da vítima.
O cyberstalking muitas vezes se mistura com outros crimes digitais, como invasão de dispositivo informático (art. 154-A, CP), difamação online, pornografia de vingança (art. 218-C, CP) e ameaça digital, compondo um verdadeiro mosaico de violência psicológica.
Na prática forense, advogados especializados em crimes cibernéticos observam que o cyberstalking representa um dos maiores desafios da atualidade, pois exige prova técnica (logs, IPs, prints, metadados) e atuação imediata para preservação da cadeia de custódia digital.
3. A Diferença Entre Stalking e Cyberstalking
Embora ambos os crimes tenham o mesmo núcleo — perseguir alguém de forma insistente e invasiva —, o stalking é físico, enquanto o cyberstalking é virtual.
No stalking, o agressor pode seguir a vítima na rua, observar sua residência, enviar presentes indesejados, aparecer em locais de convivência. Já no cyberstalking, o perseguidor se vale de meios eletrônicos: perfis falsos, mensagens automáticas, comentários públicos, e até softwares de espionagem.
O cyberstalking amplia o alcance do stalking, tornando-o mais constante, silencioso e difícil de conter, já que o agressor pode agir a qualquer hora, em qualquer lugar, de modo anônimo.
4. Proteção das Vítimas e Medidas Judiciais
As vítimas de stalking e cyberstalking têm direito a proteção imediata. A lei prevê a possibilidade de medidas protetivas de urgência, semelhantes às da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), especialmente quando a perseguição tem conotação afetiva, doméstica ou de gênero.
O Poder Judiciário pode determinar bloqueio de contatos, proibição de aproximação física ou digital, retirada de conteúdo online e outras medidas preventivas. Em casos de cyberstalking, é essencial agir rapidamente para resguardar provas digitais, pois a volatilidade das plataformas pode inviabilizar a apuração criminal.
O Ministério Público e as delegacias especializadas em crimes cibernéticos têm papel fundamental na investigação do cyberstalking, sendo recomendável que a vítima registre boletim de ocorrência digital e preserve todas as mensagens, prints e links.
5. Jurisprudência e Entendimento dos Tribunais
Os tribunais brasileiros vêm consolidando entendimento firme sobre o stalking e o cyberstalking, reconhecendo a gravidade psicológica e social dessas condutas.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem destacado que o cyberstalking é uma forma de violência psicológica e de gênero quando praticado contra mulheres, integrando o rol de crimes abrangidos pela Lei Maria da Penha (HC 759.366/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, julgado em 25/04/2023).
Assim, o cyberstalking é reconhecido não apenas como crime autônomo, mas como uma das manifestações mais sofisticadas do stalking, exigindo resposta penal e tecnológica proporcional.
6. Considerações Finais
O stalking e o cyberstalking refletem o impacto da era digital sobre a vida privada e emocional das pessoas. A sociedade conectada trouxe novas formas de convívio, mas também novos instrumentos de controle, vigilância e abuso.
A criminalização do stalking foi um avanço, mas o combate efetivo ao cyberstalking requer políticas públicas, capacitação de peritos e atuação integrada entre autoridades, plataformas digitais e profissionais do Direito.
Enquanto o stalking ameaça o corpo e a rotina, o cyberstalking ameaça a mente e a reputação — e ambos, juntos, simbolizam o desafio contemporâneo da liberdade na era da conexão.




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